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sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

E esse tal livro digital?

        Muitos amigos têm me perguntado ultimamente a respeito dos leitores digitais. Minha opinião como autor e como leitor. A resposta é fácil. Não há como não reconhecer que se trata de uma evolução, como foi o computador e o processador de textos para quem gosta de ou precisa escrever. Novos recursos, maiores facilidades, mais versatilidade.
Imaginem quem quer ler um livro no original em inglês. Ou em  espanhol, holandês, polonês talvez. Mesmo para quem morava numa cidade média ou grande, com boas livrarias, não era nada fácil. Antes era preciso procurar uma loja, encomendar o livro e aguardar pela sua chegada. Levava dias, talvez semanas.

Agora, basta clicar no aparelho e-reader, escolher a opção e fazer a compra via cartão. Em questão de segundos o livro está pronto para ser lido, mesmo que tenha vindo da Indonésia ou da Rússia.
A leitura já é, por si, um sinônimo de liberdade. O livro digital vem ampliar esse conceito à medida que incorpora novos recursos de busca no texto, acopla dicionários e pode arquivar comentários dos leitores. Mas, principalmente, derruba a barreira do espaço físico das prateleiras cheias de livros e traz bibliotecas inteiras à ponta dos dedos. Além do mais, tende a ser mais barato do que o livro em papel. 
Há quem diga que não conseguirá abandonar o contato com o papel, o velho e bom hábito de fazer anotações a lápis em suas margens. Mas é questão de tentar. E de ver que se pode compartilhar anotações com leitores do mundo todo, e mesmo recuperar as anotações com mais facilidade.
Sem falar na infinidade de árvores, matéria-prima do papel, cuja derrubada será evitada. E imagine quebrar o limite físico de uma pilha de livros. Antes, quando ia viajar, gostava de levar dois ou três livros para ler nas horas de folga. Mas ficava pensando nas dezenas de outras opções de leitura igualmente deliciosas que havia deixado para trás. Uma questão de escolha. Impossível levar uma prateleira inteira dentro da bagagem.
Agora isso é possível. Não enchendo uma mala inteira, mas apenas um pequeno e leve aparelho eletrônico. Há muito mais a ser dito a respeito dessa encantadora experiência, mas não cabe aqui neste pequeno espaço. Faltou falar ainda do conceito que a Amazon está trazendo para o Brasil, o Kindle unlimited, permitindo "alugar" os livros que a gente quiser, dentre milhares disponíveis, por um valor fixo mensal (menos de vinte reais). Mais evolução ainda.
Sem dúvida o livro digital irá ampliar a experiência de ler, seja no PC, no tablet, na nuvem da internet, no smartphone ou no e-reader. Com ele dá para ler mais e melhor, também porque ele, o livro, sempre vai acompanhar a nós, leitores, muito mais de perto.

domingo, 7 de dezembro de 2014

O eterno dilema do futebol brasileiro

     Com mais uma Copa do Mundo realizada neste marcante 2014, desta vez no "país do futebol", tivemos oportunidade de repensar mais uma vez nosso espírito brasileiro. Somos um país alegre, um povo hospitaleiro e brincalhão, e um celeiro de craques, como se diz no senso comum. Verdade. Porém, mais uma vez, provamos que ao mesmo tempo, dentro de campo nos falta equilíbrio emocional. E fora, como acontece em quase todos os setores da vida brasileira, falta organização.
     Mais uma vez, como ocorre também nos Jogos Olímpicos (a outra grande festa mundial do esporte), nós perdemos quando somos azarões (afinal, os favoritos eram os outros mesmo...) e perdemos quando somos favoritos (o favoritismo pesou).
      Isso parece não acontecer com a maioria das potências esportivas. Ou talvez aconteça, mas em menor proporção.
      Voltemos ao futebol. Somos um fornecedor de matéria-prima em estado bruto (os craques). Ninguém viu nascer mais jogadores virtuosos em sua plagas do que nós, tupiniquins. Desde os primórdios do futebol, quando tentaram mudar o nome do esporte para ludopédio, sem sucesso. Desde os tempos de El Tigre Arthur Friedenreich, de Leônidas e Domingos da Guia. Técnica é conosco mesmo. Fomos os inventores da bicicleta, do drible chamado elástico, mas certamente não do carrinho. Acontece que o futebol, como todo esporte, não é feito apenas de tática. Como na guerra, precisa de táticas e estratégias. De força mental, preparação psicológica e organização. E de bons comandantes.
     A Copa brasileira nos mostrou mais uma vez que, ao longo da história, ficamos apenas na técnica. Técnica de Pelé, de Ademir da Guia, de Rivelino, de Nilton Santos, Romário, Ronaldo, Zico, Sócrates, Tostão, Gérson, Dirceu Lopes, Ronaldinho Gaúcho... a lista é interminável. Pecamos, porém, na tática. A última aventura do nosso selecionado nacional, sob a batuta do mestre Felipão, nos mostrou que... tática? Não tivemos nenhuma. Repetimos os mesmos erros, de não ter uma variação de jogo sequer, e de ficar dependentes de um único jogador. De não termos levado um jogador experiente para os momentos críticos, um líder substituto, ainda que longe de suas condições físicas e técnicas.
     Quando eu era criança, ouvia repetirem um senso comum: os brasileiros têm ginga, têm jogo de cintura e os europeus têm cintura dura. Por isso é que somos os reis do futebol.
     De alguma maneira, isso não funciona há muito tempo.
     Nunca conseguimos aliar a técnica refinada de nossos jogadores ao sentido de uma tática apurada e eficiente. E juntar a isso uma organização primorosa (para lembrar um adjetivo bem ao gosto dos locutores de antigamente) fora de campo. Se tivéssemos chegado a isso, seríamos imbatíveis. Mas basta olhar para a nossa história recente para perceber que ainda deixamos campeonatos mal-resolvidos, títulos nacionais que até hoje são questionados e discutidos.
     Os europeus - mais uma vez a julgar pelo senso comum - conseguiram igualar nossa técnica em poucos momentos. Com Puskas, Beckenbauer, Cruyff, Baggio, Bobby Moore... mas há muito tempo desenvolveram um senso de tática e de organização que nos deixaram no chão. A diferença é tanta que praticamente nenhum técnico brasileiro consegue trabalhar com sucesso na Europa. Por outro lado, também não conseguimos atrair técnicos europeus para cá, com as exceções de praxe. Problemas culturais e financeiros pesam decisivamente.
     Por que me lembrei disso tudo agora? Não foi por causa da última Copa do Mundo. A respeito dela, muitos cronistas já falaram mais e melhor do que eu, praticamente esgotando o assunto.
     É que sempre achei curiosa a dança dos técnicos em nosso futebol. Mano Meneses acaba de se despedir do Corínthians de uma maneira não usual. Classificou o time para a Libertadores (mesmo que para a primeira fase, o que é um aceno para a tragédia), mas mesmo assim vai embora. A diretoria corintiana está desunida, é verdade. Mas o técnico gaúcho chegou no início do ano para reestruturar a equipe, saturada após a conquista do título mundial. Em um ano, não conseguiu convencer a torcida e a diretoria. Merecia mais um tempo? Ele diz que sim. Mas um ano ainda é insuficiente para substituir alguns jogadores e alterar a maneira de o time jogar, implementando um padrão de jogo e variações táticas fundamentais?
      Mano dá a entender que sua saída do Corínthians foi precoce. Foi expulso do pomar quando ia colher os frutos do seu trabalho. Tive essa impressão quando da sua saída da seleção. Ele fez inúmeras experiências e percorreu boa parte do caminho, deixando-o aberto para que Felipão chegasse e ostentasse a aura de vitorioso por algum tempo. Infelizmente, muito curto também. Mas no Corínthians talvez tivesse tido um bom tempo (considerando o número de jogos que um time tem durante todo o ano, ao contrário da seleção) e um razoável elenco à sua disposição. Mas Mano parece ser aquele tipo de técnico frio e teórico, que precisa de calma para estruturar uma equipe ao longo de várias temporadas. Não tem aquele toque do mágico que em pouco tempo faz uma equipe desencantar. Como fizeram Marcelo Oliveira e Cuca. Não se iludam, corintianos: Tite também é assim, tem um jeito lento de fazer as coisas acontecerem.
      Em nosso futebol, porém, o tempo é marcado por um compasso nervoso, ansioso.
      Na Europa um técnico como Arsène Wenger está há quase vinte anos no tradicional Arsenal inglês. Ganhou poucos títulos, tomou goleadas, fez campanhas medíocres ao longo desse tempo. Mas continua firme no posto.
      Nem tanto ao céu, nem tanto à terra. Há equipes que trocam de técnicos cinco ou seis vezes por ano por aqui. E nem por isso melhoram seus resultados. Qual será o modelo ideal?
      Essas e outras perguntas continuam no ar. Por que nossos técnicos parecem tão abaixo do nível dos técnicos europeus? Precisariam estudar mais? E por que não o fazem? Ou são os jogadores que não conseguem executar as ideias dos seus comandantes?
      Nunca tivemos tão poucos técnicos em boa consideração por público e mídia: Cuca, Tite, Marcelo Oliveira, Levir Culpi... a unanimidade nunca foi tão escassa. E enquanto isso, continua a macabra dança das cadeiras, que não leva a lugar nenhum. Azar dos clubes, e dos sofridos torcedores.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Detetives renascidos

     A literatura policial acaba de perder uma autora do nível de P. D. James, uma das notórias damas do crime (ao lado da imortal Agatha Christie, de Ruth Rendell e outras grandes escritoras do gênero) nesta última semana, ao mesmo tempo em que vê nascer outra grande tendência nessa mesma área: a continuidade de personagens, já elevados ao olimpo reservado aos heróis imortais da literatura. Falo de dois detetives inesquecíveis: o inglês Sherlock Holmes e o belga Hercule Poirot.
      Mesmo quem não leu uma novela policial em toda a vida provavelmente sabe da existência dessas personagens. O primeiro, criação original do escocês, Sir Arthur Conan Doyle, teve seu nome associado ao sinônimo de sagacidade. Foi inspirado em um professor do curso que Doyle frequentava, se não me engano medicina. Não precisaria, mas ele está de volta no romance "A casa da seda". Foram necessários muitos anos até que os herdeiros do autor autorizassem mais um retorno (dentre tantos outros, concretizados pelo próprio Doyle), aceitando que o fosse pela pena de outro escritor. O autor da proeza é Anthony Horowitz.
     O livro é muito bem escrito e a história é até certo ponto original (sem spoilers, por favor...). Porém, causa muita estranheza saber que não é mais Conan Doyle quem assina o texto. Não se sabe até que ponto é uma rejeição inconsciente, ou um real afastamento do estilo original do criador de Holmes.
      Empreitada bem mais difícil esperava Sophie Hannah, ao escrever uma aventura de Hercule Poirot. Por quê? Acho que a explicação é igualmente deslizante. Poirot é provavelmente mais lido atualmente do que Sherlock pelos aficcionados do gênero. Mas ao mesmo tempo, Sherlock é onipresente: filmes, histórias em quadrinhos, jogos de tabuleiro, e pastiches... Já assumiu, portanto, mil e uma variações. Até Disney criou certa vez um tal Berloque Gomes. Mas Poirot, não. Exceto por alguns filmes e por uma série da TV inglesa, sua vida e seu universo estão nos livros de Agatha Christie. Ou seja, nas palavras. E é nesse terreno que Sophie Hannah precisa superar seu desafio. Além disso, Poirot é mais cerebral do que Sherlock e - perdão pelo sacrilégio - até certo ponto, mais sutil. A tarefa, portanto, parece ser mais difícil. E no entanto, a leitura de "Os crimes do monograma" também vale a pena para aqueles que - como eu - não conseguem ficar por muito tempo distantes de uma boa história de detetives.
       The question is: qual será o próximo grande detetive a ressurgir pela pena de outro talentoso autor? O comissário Maigret, de Georges Simenon? Philip Marlowe? Sam Spade? Ou o briguento mas irresistível Lew Archer?
       Façam suas apostas, cavalheiros!